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sexta-feira, 23 de abril de 2010

SACRAMENTORUM SANCTITATIS TUTELA

CARTA APOSTÓLICA SOB FORMA DE «MOTU PROPRIO»
SACRAMENTORUM SANCTITATIS TUTELA(*)
DO SUMO PONTÍFICE JOÃO PAULO II
NORMAS SOBRE OS DELITOS MAIS GRAVES DE COMPETÊNCIA DA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
A tutela da santidade dos sacramentos, sobretudo da santíssima Eucaristia e da penitência, assim como a preservação dos fiéis chamados a ser partícipes do Reino do Senhor na observância do sexto mandamento do Decálogo, exigem que, para procurar a salvação das almas, "que deve ser sempre lei suprema na Igreja" (Código de Direito Canônico, cân. 1752), a própria Igreja intervenha com a sua solicitude pastoral a fim de prevenir os perigos de violação.

Já no passado, os meus predecessores providenciaram com oportunas constituições apostólicas à santidade dos sacramentos, em particular da penitência, como com a constituição Sacramentum poenitentiae de 1 de Junho de 1741 do Papa Bento XIV[1]; também os cânones do Código de Direito Canônico promulgado em 1917, juntamente com as suas fontes, com as quais foram estabelecidas sanções canônicas contra os delitos desta espécie, eram orientados para a mesma finalidade[2].

Em tempos mais recentes, para se premunir desses delitos e outros afins, a Suprema Sagrada Congregação do Santo Ofício, com a instrução Crimen sollicitationis, enviada a 16 de Março de 1962 a todos os patriarcas, arcebispos, bispos e aos demais ordinários dos lugares "também de rito oriental", estabeleceu o procedimento a seguir nessas causas, pois a sua competência judiciária, quer por via administrativa quer processual, era confiada exclusivamente à mesma. Deve-se recordar que tal instrução tinha força de lei, dado que o Sumo Pontífice, de acordo com a norma do cân. 247 §1 do Código de Direito Canônico promulgado em 1917, presidia à Congregação do Santo Ofício e a instrução procedia da sua autoridade pessoal, porque o cardeal encarregado naquele momento desempenhava as funções só de secretário.

O Sumo Pontífice Paulo VI de feliz memória confirmou a competência judiciária e administrativa na maneira de proceder "segundo as normas próprias emendadas e aprovadas" com a constituição apostólica sobre a cúria romana Regimini Ecclesiae universae de 15 de Agosto de 1967[3].

Enfim, com a autoridade que me é própria, na constituição apostólica Pastor bonus, promulgada a 28 de Junho de 1988, estabeleci expressamente: "[A Congregação para a Doutrina da Fé] julga os delitos contra a fé e os delitos mais graves cometidos tanto contra a moral quanto na celebração dos sacramentos, que a ela sejam comunicados, procede a declarar ou a aplicar as sanções canônicas de acordo com a norma do direito, quer comum quer próprio"[4], ulteriormente confirmando e determinando a competência judiciária da mesma Congregação para a Doutrina da Fé como Tribunal apostólico.

Contudo, depois da minha aprovação do Regulamento para o exame das doutrinas[5], era necessário definir pormenorizadamente tanto "os delitos mais graves cometidos contra a moral e na celebração dos sacramentos", para os quais a competência permanece exclusiva da Congregação para a Doutrina da Fé, como também as normas processuais especiais "para declarar ou aplicar as sanções canônicas".

Com esta minha carta apostólica publicada sob forma de motu proprio completei tal obra e, portanto com ela promulgo as Normas acerca dos delitos mais graves reservados à Congregação para a Doutrina da fé, distintas em duas partes: a primeira contém as Normas substanciais, a segunda as Normas processuais. Ordeno a todos os interessados que observem fielmente e com atenção. Tais normas assumem valor de lei no mesmo dia em que são promulgadas.

Não obstante qualquer disposição contrária, também digna de especial menção.
Dado em Roma, junto de São Pedro, a 30 de Abril, memória de São Pio V Papa, no ano de 2001, XXIII do meu pontificado.
JOÃO PAULO PP. II

Notas
[1] Benedictus XIV, Constitutio Sacramentum poenitentiae, 1 iunii 1741, in Codex Iuris Canonici, Pii X Pontificis Maximi iussu digestus, Benedicti Papae XV auctoritate promulgatus, Documenta, Documentum V, "Acta Apostolicae Sedis" (AAS) 9 (1917) Pars II, 505-508.
[2] Cf. Codex Iuris Canonici anno 1917 promulgatus, cann. 817; 2316; 2320; 2322; 2368 §1; 2369 §1.
[3] Cf. Paulus pp. VI, Constitutio apostolica Regimini Ecclesiae universae de Romana Curia, 15 augusti 1967, n. 36: AAS 59 (1967) 898.
[4] Ioannes Paulus II, Constitutio apostolica Pastor bonus de Romana Curia, 28 iunii 1988, art. 52: AAS 80 (1988) 874.
[5] Congregatio pro Doctrina Fidei. Agendi ratio in doctrinarum examine, 29 iunii 1997: AAS 89 (1997) 830-835.
(* ) L'Osservatore Romano, edição em português de 3 de Abril de 2010.

Guia para a compreensão dos procedimentos de base da Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) relativa às acusações de abusos sexuais

A disposição que deve ser aplicada é o Motu Proprio Sacramentorum sanctitatis tutela de 30 de Abril de 2001 juntamente com o Código de Direito Canônico de 1983. Esta é uma Guia introdutória que pode servir de ajuda para leigos e não canonistas.

A. Procedimentos preliminares
A Diocese investiga sobre qualquer suspeita de abusos sexuais por parte de um religioso em relação a um menor.
Se a suspeita tiver verossimilhança com a verdade, o caso é remetido para a CDF. O bispo local transmite qualquer informação necessária à CDF e exprime a própria opinião sobre os procedimentos a serem seguidos e as medidas a serem adotadas a curto e a longo prazo.
Deve ser dada sempre continuidade às disposições da lei civil no que se refere à entrega de crimes às autoridades competentes.
Na fase preliminar e até quando o caso se concluir, o bispo pode impor medidas preventivas para a salvaguarda da comunidade, incluídas as vítimas. Na realidade, é sempre conferido ao bispo local o poder de tutelar as crianças limitando as atividades de qualquer sacerdote na sua Diocese. Isto faz parte da sua autoridade ordinária, que ele é solicitado a exercer em qualquer medida necessária para garantir que as crianças não sofram danos, e este poder pode ser exercido à discrição do bispo antes, durante e depois de qualquer procedimento canônico.

B. Procedimentos autorizados pela CDF
A CDF estuda o caso apresentado pelo bispo local e, onde for necessário, exige informações suplementares.
A CDF tem à disposição uma série de opções:

1. Processos penais
A CDF pode autorizar o bispo local a conduzir um processo penal judiciário diante de um Tribunal eclesial local. Qualquer apelo em casos semelhantes deverá ser eventualmente apresentado a um tribunal da CDF.
A CDF pode autorizar o bispo local a instruir um processo penal administrativo diante de um delegado do bispo local, assistido por dois acessores. O sacerdote acusado é chamado a responder às acusações e a examinar as provas. O acusado tem o direito de apresentar recurso à CDF contra um decreto que o condene a uma pena canónica. A decisão dos cardeais membros da CDF é definitiva.
No caso em que o sacerdote seja julgado culpado, os dois procedimentos – judiciário e administrativo – penal podem condená-lo a um certo número de penas canônicas, a mais séria das quais é a demissão do estado clerical. Também a questão dos danos sofridos pode ser tratada diretamente durante estes procedimentos.

2. Casos referidos diretamente ao Santo Padre
Em casos particularmente graves, nos quais processos civis criminais tenham considerado um religioso culpado de abusos sexuais sobre menores, ou no qual as provas sejam esmagadoras, a CDF pode escolher apresentar este caso diretamente ao Santo Padre com o pedido de que o Papa emita um decreto de demissão do estado clerical "ex officio". Não existe recurso canônico depois de um semelhante decreto papal.
A CDF apresenta ao Santo Padre também pedidos de sacerdotes acusados que, conscientes dos crimes cometidos, peçam para ser dispensados das obrigações do sacerdócio e apresentem pedido para voltar ao estado laical. O Santo Padre concede tal pedido para o bem da Igreja ("pro bono Ecclesiae").

3. Medidas disciplinares
Nos casos em que o sacerdote acusado tenha admitido os próprios crimes e tenha aceitado viver uma vida de oração e penitência, a CDF autoriza o bispo local a emitir um decreto que proíbe ou limita o ministério público desse sacerdote. Tais decretos são impostos através de um preceito penal que incluem uma pena canônica pela violação das condições do decreto, sem excluir a demissão do estado clerical. Contra estes decretos é possível o recurso à CDF. A decisão da CDF é definitiva.

C. A revisão do Motu Proprio
A CDF está a rever alguns artigos do Motu Proprio Sacramentorum sanctitatis tutela, a fim de atualizar o mencionado motu proprio de 2001 à luz das especiais faculdades reconhecidas à CDF pelos Pontífices João Paulo II e Bento XVI. As modificações propostas e sob debate não alterarão os mencionados procedimentos.

FONTE: http://www.vatican.va/resources/resources_guide-CDF-procedures_po.html

quinta-feira, 22 de abril de 2010

“TEMOS UM GRANDE SUMO SACERDOTE”

“TEMOS UM GRANDE SUMO SACERDOTE”
Frei Raniero Cantalamessa, OFMCap
(Pregação da Sexta-Feira Santa, na Basílica de S. Pedro - 02/04/2010)

“Temos um grande Sumo Sacerdote que atravessou os céus, Jesus, o Filho de Deus”: assim se inicia o trecho da Carta aos Hebreus que ouvimos na segunda leitura. No ano sacerdotal, a liturgia da Sexta-feira Santa nos convida a percorrer a origem histórica do sacerdócio cristão.
Esta é a fonte de ambas realizações do sacerdócio: aquela ministerial, dos bispos e presbíteros, e aquela universal, de todos os fiéis. Também esta, de fato, está fundamentada no sacrifício de Cristo que, como diz o Apocalipse, “nos ama, que nos lavou de nossos pecados no seu sangue e que fez de nós um reino de sacerdotes para Deus e seu Pai” (Ap 1, 5-6).
É de vital importância, portanto, compreender a natureza do sacrifício e do sacerdócio de Cristo, pois é neles que sacerdotes e leigos, embora de maneiras diferentes, devem se inspirar e buscar viver suas exigências.
A Carta aos Hebreus explica no que consiste a novidade e o caráter único do sacerdócio de Cristo, não apenas com relação ao sacerdócio da antiga aliança, mas também, como nos ensina a história das religiões, com relação a toda instituição sacerdotal, inclusive fora da Bíblia. “Cristo, sumo sacerdote dos bens vindouros [...] adentrou de uma vez por todas no santuário, não com o sangue de carneiros ou novilhos, mas com seu próprio sangue”. Desse modo, adquiriu para nós a redenção eterna. “Pois se o sangue de carneiros e de touros e a cinza de uma vaca, com que se aspergem os impuros, santificam e purificam pelo menos os corpos, quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu como vítima sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência das obras mortas para o serviço do Deus vivo!” (Hb 9, 11-14).
Qualquer outro sacerdote oferece algo externo a si, mas Cristo ofereceu a si próprio; qualquer outro sacerdote oferece vítimas, mas Cristo ofereceu a si mesmo como vítima! Santo Agostinho sintetizou em uma fórmula bem conhecida este novo gênero de sacerdócio, no qual sacerdote e vítima são uma coisa só: “Ideo sacerdos, quia sacrificium”: “sacerdote porque vítima”[1].
Em 1972, um célebre pensador francês lançava a tese segundo a qual “a violência é o coração e a alma secreta do sagrado”[2]. De fato, na origem e no centro de qualquer religião está o sacrifício, e o sacrifício encerra morte e destruição. O jornal “Le Monde” saudava esta afirmação, dizendo que fazia daquele ano “um ano a ser assinalado com um asterisco nos anais da humanidade”. No entanto, já anteriormente a esta data, este estudioso se aproximara do cristianismo, e na Páscoa de 1959, havia tornado pública sua “conversão”, declarando-se crente e voltando à Igreja.
Isto o permitiu, em seus estudos subsequentes, não se deter na análise do mecanismo da violência, mas expor os meios de superá-la. Infelizmente, muitos continuam a citar René Girard apenas como aquele que denunciou a ligação entre o sagrado e a violência, mas não mencionam o Girard que evidenciou, no mistério pascal de Cristo, a ruptura total e definitiva desta ligação. Para ele, Jesus desmascara e desfaz o mecanismo de bode expiatório que sacraliza a violência, ao fazer-se ele próprio, inocente, vítima de toda a violência[3]. O processo no qual estaria a gênese da religião, segundo Freud, é assim derrubado.
Em Cristo, é Deus quem se faz vítima, e não a vítima (para Freud, o pai primordial) que, ao ser sacrificada, é sucessivamente elevada à dignidade divina (o Pai dos céus). Já não é o homem que oferece sacrifícios a Deus, mas é Deus quem se “sacrifica” pelo homem, entregando à morte seu Filho unigênito (cf. Jo 3,16). Assim, o sacrifício não mais se destina a “aplacar” a divindade, mas a aplacar o homem, fazendo-o renunciar a sua hostilidade nas relações com Deus e com o próximo.
Cristo não veio portando o sangue de outros, mas seu próprio sangue. Não pôs seus próprios pecados sobre os ombros de outros – fossem homens ou animais; ao contrário, sustentou os pecados dos outros sobre seus próprios ombros: “Carregou os nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro” (1 Pe 2, 24).
É possível, então, continuar a falar em sacrifício ao referir-se à morte de Cristo, e portanto à Missa? Durante muito tempo, o estudioso citado rejeitou esta ideia, considerando-a por demais associada ao conceito de violência; mas, posteriormente, passou a aceitar a possibilidade de um novo gênero de sacrifício em Cristo, vendo nessa mudança de significado “o fato central da história religiosa da humanidade”.
Visto sob essa ótica, o sacrifício de Cristo contém uma mensagem formidável para o mundo de hoje. Grita para o mundo que a violência é um resíduo arcaico, uma regressão a estágios primitivos e superados da história humana e, em se tratando de crentes, um retardamento censurável e escandaloso frente à tomada de consciência do salto de qualidade operado por Cristo.
Lembra-nos também que a violência está derrotada. Em quase todos os mitos antigos, a vítima é a derrotada e o carrasco, o vencedor. Jesus alterou o sentido da vitória. Inaugurou um novo gênero de vitória, que não consiste em fazer vítimas, mas sim em fazer-se vítima. “Victor quia victima!”, vencedor porque vítima, assim Agostinho define o Jesus da cruz[4].
O valor moderno da defesa das vítimas, dos fracos e da vida ameaçada tem origem no terreno do cristianismo, sendo um fruto tardio da revolução operada por Cristo. Dispomos de uma contraprova.
Somente ao abandonar a visão cristã (como fez Nietzsche) para retomar a pagã, é que se perde esta conquista e volta-se a exaltar “o forte, o poderoso, até sua expressão mais sublime, o super-homem”, definindo-se a moral cristã como “uma moral de escravos”, fruto do ressentimento impotente contra os fortes.
Lamentavelmente, porém, a mesma cultura moderna que condena a violência a favorece e exalta, paralelamente. Rasgamos as vestes diante de alguns acontecimentos sanguinários, mas não nos damos conta de que se prepara o terreno para que estes ocorram justamente com aquilo que é anunciado nas páginas dos jornais ou nos programas de televisão.
O gosto com o qual se fala da violência e a sanha de ser o primeiro e mais cru ao descrevê-la nada mais fazem que promovê-la. O resultado não é uma catarse do mal, mas sim um incitamento a este. É inquietante que a violência e o sangue tenham se tornado alguns dos ingredientes de maior apelo nos filmes e nos vídeo-games, e que sejamos tão atraídos por eles a ponto de nos parecer divertido contemplá-los.
O mesmo estudioso que já mencionamos evidenciou a matriz na qual se dá o mecanismo da violência: o mimetismo, aquela inclinação humana inata de considerar desejáveis as coisas desejadas pelos outros, e que leva a repetir aquilo que vemos outros fazerem. A psicologia do pacote é justo aquela que conduz à escolha do “bode expiatório”, para encontrar, na luta contra um inimigo comum – em geral, o elemento mais frágil, o diferente – uma coesão, ainda que momentânea e artificial.
Temos exemplos desta dinâmica na violência recorrente nos estádios de futebol, no bullying nas escolas e em certas manifestações públicas que deixam um rastro de destruição por onde passam. Uma geração de jovens que teve o raríssimo privilégio de não ter conhecido uma verdadeira guerra e de não terem sido jamais convocados às armas, diverte-se (por que se trata de uma brincadeira, ainda que estúpida e eventualmente trágica) inventando pequenas guerras, impelidos pelos mesmos instintos que moviam as hordas primordiais.
Mas há uma violência ainda mais grave e disseminada do que esta dos jovens nos estádios e nas ruas. Não me refiro àquela violência dirigida às crianças, com a qual estão manchados até mesmo elementos do clero; sobre essa violência já se fala suficientemente em outros âmbitos. Falo da violência contra a mulher. Esta é uma ocasião apropriada para levar as pessoas e instituições que lutam contra essa violência à compreensão de que Cristo é seu melhor aliado.
Trata-se de uma violência que se torna ainda mais grave quando cometida no abrigo e na intimidade do lar, frequentemente justificada com base em preconceitos pseudo-religiosos e culturais. As vítimas encontram-se desesperadamente sós e indefesas. Somente hoje, graças ao apoio das muitas associações e instituições, é que algumas mulheres encontram forças para denunciar seus agressores.
Muito dessa violência tem um fundo sexual. É o macho que acredita demonstrar sua virilidade ao submeter a mulher, sem se dar conta de que, desse modo, evidencia tão simplesmente sua insegurança e sua covardia. Também na relação com a mulher que erra, que contraste há entre o agir de Cristo e aquele que ainda verificamos em certos ambientes! O fanatismo invoca o apedrejamento; Cristo responde, àqueles que lhe haviam apresentado a adúltera: “Quem de vós não tiver pecado, que atire a primeira pedra” (Jo 8, 7). O adultério é um pecado que se comete sempre a dois, mas para o qual apenas um tem sido sempre (em algumas partes do mundo, ainda hoje) punido.
A violência contra a mulher torna-se ainda mais odiosa ao refugiar-se justamente no ambiente onde deveria reinar o respeito recíproco e o amor – na relação marido e mulher. É verdade que a violência não advém sempre de uma das partes, e que se pode ser violento também com a língua e não apenas com as mãos; mas não se pode negar que, na vasta maioria dos casos, a vítima é a mulher.
Há famílias nas quais o homem se julga autorizado a levantar a voz e as mãos para a dona de casa. Esposa e filhos vivem sob a constante ameaça da “ira do papai”. A estes homens talvez valesse dizer: “Caros colegas homens, criando-vos varões, Deus não vos concedeu o direito de bater os punhos contra a mesa por qualquer motivo. A palavra dirigida a Eva após sua culpa “Ele (homem) te dominará” (Gn 3,16), era uma amarga previsão, não uma autorização.
João Paulo II inaugurou a prática de pedir perdão por erros coletivos. Um desses pedidos de perdão, talvez entre os mais justos e necessários, é o perdão que uma metade da humanidade deveria pedir à outra metade, os homens às mulheres. Esse pedido não deve permanecer genérico ou abstrato. Deve levar a gestos concretos de conversão, a palavras de desculpas e de reconciliação no seio da família e da sociedade.
O trecho da Carta aos Hebreus que ouvimos prossegue dizendo: “Nos dias de sua carne, em alta voz e com lágrimas nos olhos, ofereceu orações e súplicas àquele que poderia salvá-lo da morte”. Jesus conheceu toda a crueza da condição de vítima, o grito sufocado e as lágrimas silenciosas. Na verdade, “não dispomos de um sumo sacerdote que não possa partilhar conosco nossas fraquezas”. Em cada vítima da violência Cristo revive misteriosamente sua experiência terrena. A esse propósito diz ele “foi a mim mesmo que o fizestes” (Mt 25, 40).
Por uma rara coincidência, neste ano nossa Páscoa cai na mesma semana da Páscoa judaica, que é a matriz na qual esta se constituiu. Isso nos estimula a voltar nosso pensamento aos nossos irmãos judeus. Estes sabem por experiência própria o que significa ser vítima da violência coletiva e também estão aptos a reconhecer os sintomas recorrentes. Recebi nestes dias uma carta de um amigo judeu e, com sua permissão, compartilho um trecho convosco. Dizia:
“Tenho acompanhado com desgosto o ataque violento e concêntrico contra a Igreja, o Papa e todos os féis do mundo inteiro. O recurso ao estereótipo, a passagem da responsabilidade pessoal para a coletividade me lembram os aspectos mais vergonhosos do anti-semitismo. Desejo, portanto, expressar a ti pessoalmente, ao Papa e à toda Igreja minha solidariedade de judeu do diálogo e de todos aqueles que no mundo hebraico (e são muitos) compartilham destes sentimentos de fraternidade. A nossa Páscoa e a vossa têm indubitáveis elementos de alteridade, mas ambas vivem na esperança messiânica que seguramente reunirá no amor do Pai comum. Felicidades a ti e a todos os católicos e Boa Páscoa”.
Também nós, católicos, felicitamos os irmãos judeus, desejando-lhes Boa Páscoa. E o fazemos com palavras de seu antigo mestre Gamaliel, inseridas no Seder pascal hebraico e incorporadas na mais antiga liturgia cristã:
“Ele nos conduziu
da escravidão à liberdade,
da tristeza à alegria,
do luto à festa,
das trevas à luz,
da servidão à redenção
Por isso diante dele dizemos: Aleluia”[5]

Notas originais em italiano:
[1] S. Agostino, Confessioni, 10,43.
[2] Cfr. R. Girard, La violence et le sacré, Grasset, Parigi 1972
[3] M. Kirwan, Discovering Girard, Londra 2004.
[4] S. Agostino, Confessioni, 10,43.
[5] Pesachim, X,5 e Melitone di Sardi, Omelia pasquale,68 (SCh 123, p.98).

sexta-feira, 16 de abril de 2010

IV SEMINÁRIO PARA PREGADORES

Em breve, entrará no ar o hotsite para divulgar o encontro e repassar as últimas informações para todos. Até lá, você pode nos acompanhar da seguinte forma:

- TWITTER: twtitter.com/seminpregadores

- ORKUT: http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=12820560361685945100

- YOUTUBE: www.youtube.com/seminariopregadores

Material de divulgação IV Seminário para pregadores

Olá irmãos.
Abaixo seguem alguns materiais de divulgação para o IV Seminário para pregadores que estão sendo desenvolvidos. Façam o download e nos ajudem na divulgação.
Em breve disponibilizaremos mais conteúdos.
(avatar para MSN, ORKUT e WALLPAPER)